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EDITORIAL

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Hugo de Almeida Vilares
Hugo de Almeida Vilares
Faculdade de Economia do Porto

UMA RESPOSTA ESTRUTURAL PARA A CRISE HABITACIONAL NA REGIÃO DE LISBOA

Crises de acessibilidade à habitação ocorrem ciclicamente no desenvolvimento das urbes, causadas por momentos de aceleração da procura habitacional que encontra uma oferta incapaz de dar resposta, seja por restrições da capacidade do setor de construção, seja por questões de regulação urbanística ou da construção. A este enquadramento, a crise financeira de 2008-2011, que delapidou parte da capacidade construtiva do país, acrescentou um fator extra de dificuldade.

Não raras vezes, ato contínuo, uma crise de acessibilidade depois de contida tem por sucessão um hangover causado pelo excesso de oferta que chegou ao mercado na tentativa de responder à crise original. A par, ficam erros urbanísticos que geram consequências para décadas, seja a exclusão social, seja a construção deficiente que a urgência da crise pressionou.

O principal sintoma destas crises é hoje notório – quem não adquiriu habitação, ou assegurou um contrato estável e blindado de arrendamento, tem fortes dificuldades de encontrar, ou manter, uma solução habitacional de qualidade.

As primeiras 25% famílias na distribuição de rendimentos são forçados a soluções habitacionais de sobrelotação, indignas, para a rua, ou para um fenómeno que Portugal tinha sido capaz de conter – as barracas. As soluções de habitação pública são lentas a materializar.

Para os segmentos populacionais seguintes, que deixam de encontrar no mercado habitação acessível e não têm carências suficientes para serem elegíveis para habitação pública, a degradação habitacional não deixa de ocorrer, com impactos na qualidade de vida e poder de compra destas famílias. A tentação de subsidiação massiva leva a aumentos de preços e rendas, não contribuindo para a solução da crise que tem uma essência basilar básica – faltam casas.

A expansão da oferta exige mais produção e produtividade no setor da construção – para assegurar mais casas a um preço mais baixo. A reabilitação, sendo o processo de regeneração natural e sendo possível num cenário de equilíbrio a preços comportáveis que seja a principal estratégia de intervenção, não tem nem produtividade nem a escala suficiente para assegurar quantidade necessária com preços acessíveis. Aliás, com um setor da construção com capacidade limitada pode resultar num crescimento de stock habitacional menor dada a singularidade de cada intervenção.

O esforço público habitacional sendo necessário para responder a situações mais prementes, devido ao efeito de redistribuição que pode trazer se o mecanismo de atribuição do edificado for bem desenhado, corre o risco per se de crowding-out, ou seja alarga pouco a capacidade de oferta habitacional do país, por falta de perenidade e compromisso da política de promoção pública, e, portanto, limita-se muitas vezes a um efeito de redistribuição, que deixa de fora demasiadas carências habitacionais.

Assim, é preciso complementar os instrumentos anteriores com a projeção de áreas de expansão das urbes. Com uma visão supramunicipal, as operações de reabilitação urbanística e a capacidade de o urbanismo planear novas centralidades sustentáveis, socioeconomicamente diversas e integradas é fundamental para evitar que a pressão da crise determine soluções apressadas, desequilibradas e mal construídas que resolvendo a falta de casas perpetue erros urbanísticos e exclusão social.

Neste espírito, começa a ser definida a área metropolitana de Lisboa a médio prazo. Hoje, já contempla a nova localização do aeroporto, o projeto Parques Cidades do Tejo, a linha de alta velocidade, a expansão da ferrovia e do metropolitano, e o reforço da capacidade de travessia do tejo. A estratégia de avançar na definição do futuro da região de Lisboa, oferece a resposta mais capaz para conter a crise nessa região.

Tendo a capacidade de prever procura de construção de médio prazo e, com isso, alavancar o crescimento da capacidade construtiva, o objetivo deve ser construir em escala e com métodos modernos, o que é diferente de construir urbanisticamente desordenado, arquitetonicamente feio ou tecnicamente errado. Neste processo, integrando promotores públicos, cooperativos e privados, criar novas centralidades para todas as classes sociais, evitando processos sucessivos de Not in my backyard (NIMBY) onde a expansão habitacional é empurrada de local em local.

Já fizemos isso na Alta de Lisboa, em Telheiras ou na Parque Expo. Olhando hoje para o resultado, existem melhorias a implementar. Porém, dada a urgência, o País não aceitará que este processo fique embrulhado em burocracia. ou que o resultado seja um emaranhado de erros urbanísticos. Este é o desafio central que atravessamos.

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