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EDITORIAL

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Hugo de Almeida Vilares
Hugo de Almeida Vilares
Faculdade de Economia do Porto

SOLUÇÕES PARA A CRISE DE HABITAÇÃO EM PORTUGAL

A crise de habitação em Portugal é uma crise de acessibilidade.

Não foi causada pela existência de casas vagas, metade delas atualmente disponíveis para venda ou arrendamento. Mesmo que a taxa de habitações vagas (cerca de 11%), esteja acima da taxa estrutural do mercado, dificilmente será a tentar apenas ocupar os 5% de casas permanente e inexplicavelmente vagas que o problema se resolve. Na mesma linha, é falacioso que seja possível transferir todos os Alojamentos Locais (AL) para habitação, ou que todos estes ALs tenham saído da oferta no segmento residencial, tendo uma parte sido reabilitada e saído dos devolutos.

Relativamente aos residentes não habituais, os vistos gold e nómadas digitais, representam cerca de somente um décimo da imigração recebida. Assim, tendemos a esquecer o debate acerca dos outros 9 décimos de emigrantes, que também procuram habitação, e confundimos análises de justeza de tratamentos fiscais preferenciais com o impacto destes cidadãos no mercado de habitação. Também não há evidência que a presente crise resulte de um movimento especulativo. A melhor evidência mostra que a procura estrutural existente em Portugal cresceu de forma substancial e não tem encontrado reflexo numa oferta reativa, pelo que conseguimos explicar pelos fundamentais do mercado o crescimento de preços medianos verificado.

Por outro lado, a crise não tem a mesma expressão em todo o território metropolitano. Os processos de licenciamento são muito diferentes entre municípios, e existem municípios, como o do Porto, que são muito mais eficientes a conseguir analisar e despachar processos que outros. Depois os próprios custos de construção, em particular a disponibilidade de mão de obra, que tem diferenças regionais, parecem beneficiar a região Norte.

Por fim, propostas de travão de rendas, conforme se viu em 2022, acabam por impactar fortemente quem está fora do mercado, e propostas de subsidiação generalizada ignoram que ao aumentar a disponibilidade a pagar dos compradores, ou arrendatários, sem aumentar a oferta, resultam numa subida de preços e rendas.

Assim, devemos perguntarmo-nos o que fazer. No estudo da fundação Francisco Manuel dos Santos defendemos 4 direções prioritárias. Primeiro, devemos garantir uma expansão efetiva da oferta, quer seja por reabilitação, disponibilização de vagos, ou construção, em todos os segmentos residenciais, com um foco em fazer face a um maior número de agregados familiares (2,4% aumento na última década) mais pequenos (agregados de 1 elemento cresceram 18% no mesmo período). Devemos projetar as áreas de expansão das nossas áreas metropolitanas, com redes de transporte públicos que desbloqueiem novos territórios, permitindo projetar cidades sustentáveis, harmoniosas e urbanisticamente integradas. Aqui, além de participar no planeamento e apoio ao investimento privado, o Estado deve também tomar parte aumentando o seu próprio parque habitacional particularmente em territórios onde seja particularmente reduzido, e cerzindo-o na malha urbana de forma harmoniosa.

 Devemos igualmente fomentar o Built-to-Rent, através de estabilidade regulativa de todo o mercado de arrendamento, diversificando o senhorio típico do pequeno aforrador-proprietário, quebrando assim com a anemia natural de um mercado instável devido a evolução fiscal e legislativa particularmente imprevisível, e garantindo que este se torna uma efetiva porta de entrada para os jovens no mercado de habitação. Um mercado de arrendamento dinâmico é crítico para garantir estabilidade de rendas e mobilidade em particular aos jovens que se encontram em processos de estabilizar a sua própria carreira laboral e estrutura familiar.

Por fim, se a expansão da oferta é uma necessidade relativamente consensual, devemos apoiar o desígnio de reduzir custos de contexto evitáveis à construção. Assim, simplificar e desburocratizar o licenciamento, reduzindo a sua arbitrariedade é um caminho relevante a seguir, tal como rever a fiscalidade que devido a alguns impostos progressivos com os preços de transação, como o IMT, significou aumentos da carga fiscal sobre o setor da construção quando precisamente precisamos de maior produção. Repensar o equilíbrio entre impostos de construção, posse e aquisição de habitação, e qual a carga fiscal efetiva que devemos ter neste mercado é relevante.

Com estas medidas implementadas hoje, e a começar a dar resultados nos próximos 5-10 anos, resta-nos subsidiar temporariamente o arrendamento para os casos de maior fragilidade na acessibilidade habitacional, e aqueles onde o aumento de taxas de juro impactou o orçamento familiar de forma particularmente severa.

 

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