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EDITORIAL

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António Ramalho
António Ramalho
Conselho Editorial

IMOBILIÁRIO: DA REABILITAÇÃO DA PROMOÇÃO, À PROMOÇÃO DA REABILITAÇÃO

Não me tenho cansado de afirmar e, na minha opinião, de provar que o sector do imobiliário em Portugal é profundamente maduro. Apenas o facto de termos uma das mais altas taxas de proprietização da Europa (cerca de 70%), o facto de termos um dos maiores parques habitacionais per capita (5 981,4 mil fogos) e de tudo isto ter sido realizado com um nível de endividamento globalmente equilibrado (61,6% das casas sem crédito e um total de crédito à habitação de 46,5% do PIB, não longe da média europeia de 40,6%) são sintomas seguros desta maturidade, diria mesmo, são sintomas da robustez do mercado.

Esta maturidade e robustez do mercado não pode ocultar problemas no acesso à primeira habitação e oferta adequada às famílias de menores rendimentos. Tais questões tem tido eco na narrativa oficial.

Porém, existem questões de fundo, que têm passado despercebidas neste mercado e que mereceriam análise mais cuidada.

Uma delas é o difícil equilíbrio entre a reabilitação e a construção nova. Num país de muitas casas, com áreas generosas (média em 2012 de 112 m2) e normalmente com utilização uni-fogo (mais de 60% são moradias) era de esperar que a reabilitação viesse a ter uma importância cada vez mais relevante. Porém, não é isso que se verificou nos últimos anos. Se as casas reabilitadas representavam mais de 1/4 das habitações licenciadas em 2017 (27,8%) em 2020 já só representaram 22% e em 2022 representaram menos de 1/5 das obras licenciadas (18,4%).

No país com mais casas per capita da Europa, entre 2017 e 2022 as habitações novas licenciadas passaram de 72,2% para 81,8%. Durante os últimos anos foi constante a descida do licenciamento de reabilitação e uma progressão ligeira do licenciamento para nova construção. O “gap” entre as duas importâncias relativas cresceu 7,1% entre 2017 e 2022.

Porque se verificou esta tendência contraditória com o natural equilíbrio esperado de mercado? Várias razões podem-no justificar. Primeiro a mudança de hábitos e necessidades. Isso justifica, por exemplo, o ganho de importância das obras de ampliação e de alteração sobre a reconstrução. Segundo, os preços da reabilitação têm vindo a tornar-se relativamente mais caros face às exigências climáticas e ambientais. Terceiro, os desvios para outras funcionalidades, nomeadamente AL, podem ter contribuído para diminuir ainda mais o espectro habitacional do universo recuperado.

Todas estas razões são válidas certamente, mas não iriam influenciar a redução de importância da reabilitação num mercado imobiliário maduro e robusto.

O que, de facto justifica esta tendência recente, aparentemente contraditória, é, sobretudo, o drástico envelhecimento do nosso parque habitacional.

A falta de oferta habitacional nova na última década criou vários desequilíbrios que irão demorar a corrigir. Este é um deles. O aumento do parque habitacional na última década em apenas 104 mil fogos atirou o nosso rácio de envelhecimento da habitação para valores preocupantes e, pasme-se, temos agora menos casas com menos de 10 anos (3.1%) do que casas com mais de 100 anos (4,9%). Temos mais de 50.3% dos nosso edificado com mais de 40 anos (o tempo aconselhável para a amortização de um ativo imobiliário, recorde-se).

É por esta razão que a promoção imobiliária para construção nova será a inevitável prioridade nos próximos 5 anos. O mercado tratou de a resgatar, de torná-la necessária, mesmo urgente.

Mas estruturalmente, atingido um novo equilíbrio entre procura e oferta, no nosso mercado maduro e robusto, a reabilitação urbana virá a representar cerca de um terço da nossa atividade imobiliária. E essa tendência será estrutural.

No final da década estaremos cá para confirmar. Até lá promova-se a construção nova e permita-se ao mercado funcionar.

 

 

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