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EDITORIAL

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Ricardo Guimarães
Ricardo Guimarães
Diretor da Ci

NÃO AJUSTA VIA PREÇOS. NÃO AJUSTA VIA VENDAS. AJUSTA PELA RECONFIGURAÇÃO GEOGRÁFICA.

Os dados de outubro sinalizam um mercado numa dinâmica que contrasta
com o sentimento e expectativas gerais. 

Os preços subiram 1,3% face ao mês anterior, acumulando uma valorização de 16,4% desde o começo do ano. As vendas mantiveram o ritmo anterior, descendo nos últimos três meses somente 1,6% face aos três meses anteriores. O pipeline imobiliário, medido pelo número de novos fogos em licenciamento, aumentou 13% face ao ritmo médio de 2021, sinalizando uma perspetiva positiva do mercado face à procura.

Localmente, já ao nível da cidade do Porto, a retoma do investimento é sentida a partir do respetivo Centro Histórico (CHP), pólo de atratividade turística, onde a atividade transacional subiu 28% face ao último semestre de 2021, período no qual se observava já uma recuperação relativamente ao período de estagnação resultante da pandemia. Este movimento, importa frisar, não foi traduzido num aumento de preços, mantendo-se neste território a trajetória oscilante de preços, com subidas e descidas, redundando numa linha de estabilidade sentida desde 2019. A recuperação do investimento nas demais ARUs do Porto, contudo, foi ainda mais relevante, traduzindo a progressiva atratividade de novas centralidades na cidade, com destaque para a Corujeira, pelo respetivo ganho de quota no mercado, aproximando-se do padrão de ARUs como Massarelos e Lordelo do Ouro. É um movimento alinha com o reforço de ganho de relevância da ARU de Campanhã, que se afirma como o terceiro eixo de investimento entre as ARUs da cidade, depois do CHP e da Baixa, fazendo emergir a zona oriental da cidade como um mercado com cada vez maior potencial.

Este novo padrão geográfico pode igualmente ser identificado numa análise à escala das freguesias, sendo evidente o contraste da dinâmica das freguesias de expansão da cidade, como sejam Paranhos, Campanhã e Ramalde, onde o número de vendas nos últimos três meses subiu significativamente, por contraponto às freguesias consolidadas, do centro e marginal da cidade, onde o movimento foi de perda.

Numa análise progressivamente mais alargada, em zoom-out, desta feita entre os vários concelhos da área metropolitana, os sinais são consistentes com o padrão identificado acima. Analisando a partir da informação do pipeline imobiliário, observa-se uma recomposição do mercado. Pelo seu lado, a cidade do Porto vê o pipeline descer 27% face à média de 2021, dando continuidade à trajetória de redução da promoção imobiliária iniciada em 2019. Essa redução leva a quota da cidade no contexto metropolitano para apenas 20% dos novos fogos em licenciamento, quando em 2019 representava 50%. Curiosamente, a contração registada no Porto é acompanhada pelo mercado da cidade de Matosinhos, onde o volume de novos fogos em projeto caiu nuns expressivos 54% face a 2021 (em média mensal), equiparando este mercado aos dos concelhos de Vila do Conde e Maia, historicamente menos dinâmicos face ao primeiro.

A grande beneficiária da reconfiguração geográfica do mercado é a cidade de Vila Nova de Gaia. De janeiro a setembro, Gaia afirma-se como o concelho com o maior pipeline imobiliário não só metropolitano como mesmo nacional, acima de não só do Porto, como de Lisboa. Tal como no caso de Lisboa, cuja reversão do investimento beneficiou as respetivas periferias, em especial Oeiras, no caso do Porto a contração observada teve como contraponto o aumento da atratividade de Gaia, um local competitivo em preço e urbanidade. No entanto, há que dizê-lo, o elevado volume de promoção neste mercado, assim como o respetivo progressivo aumento de qualidade, fazem com que cada vez menos se distancie do nível de preços praticado nos mercados mais caros, atingindo já preços médios acima de 3.150 euros/m², pouco abaixo dos 3.350 euros/m² de Matosinhos. Concomitantemente, cidades como Gondomar e Maia são hoje palco de fortes valorizações, traduzindo a pressão de procura em que se encontram. Ainda com relativamente baixos níveis de promoção, estes mercados começam a entrar no radar dos promotores, cuja estratégia parece ser a de identificar em cada momento as geografias onde podem oferecer casas em preços atrativos mais para as famílias.

Assim, o racional do mercado está perfeitamente identificado. Não ajusta via queda dos preços. Não ajusta via queda nas vendas. Antes,
ajusta pela reconfiguração geográfica.

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