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EDITORIAL

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Ricardo Guimarães
Ricardo Guimarães
Diretor da Ci

Imobiliário comercial, na encruzilhada entre a crise e a oportunidade

O mercado de imobiliário comercial português teve em 2021 um ano de recuperação, atingindo um retorno total de 6,8%, segundo os dados do IPD-MSCI. É uma forte recuperação após o resultado de 0,3% em 2020.

O desempenho em 2021 decorreu em especial do comportamento na componente de valorização de capital, com este mercado a passar de uma desvalorização de 4,2% em 2020 para uma valorização de 1,8% neste último ano.

Para esse resultado contribuiu a recuperação de rendas em alguns setores mais afetados pela pandemia, designadamente os setores de retalho e hoteleiro. Mas contribuiu também a redução das yields, num movimento que reflete o robustecimento do mercado imobiliário enquanto ativo de investimento, designadamente o comercial, dando provas de forte resiliência, mesmo num quadro tão adverso como o que constituiu a pandemia Covid-19.

Um dos pilares desse padrão de segurança no investimento prende-se com o comportamento das rendas, cuja estabilidade e previsibilidade faz deste tipo de imóveis uma classe de ativos preferencial, em especial para investidores mais conservadores, orientados para uma lógica de rendimento.

Chegados a este ponto, o mercado enfrenta novos desafios. O maior deles decorre das incontornáveis consequências da invasão na Ucrânia, traduzidas em incerteza e em inflação.

A inflação coloca interrogações precisamente quanto ao comportamento de ambas as variáveis acima referidas: rendas e yields. De facto, no futuro próximo, será no balanço entre ambas que se ditará a capacidade que o mercado terá de continuar a entregar valorizações.

O que é normal esperar, num quadro em que a inflação de traduza em aumentos das taxas de juro, será o aumento das yields de mercado, situação a partir da qual se geram tensões de desvalorização.

Em paralelo, por motivos semelhantes, haverá pressão para o aumento das rendas, desta forma reequilibrando a equação e promovendo a estabilidade do valor intrínseco dos ativos.

Qual o saldo?

Na verdade, parece ser mais fácil observa-se uma subida nas yields do que nas rendas, já que as empresas ocupantes poderão ter dificuldade em acomodar esse aumento de custos, certamente resistindo ou procurando alternativas no caso das mesmas se efetivarem.

Contudo, do mesmo modo, não se pode ser afirmativo quanto ao comportamento dos investidores e de que forma vão ou não alterar o seu posicionamento de risco, pressionando para a subida de yields.

Em concreto no mercado nacional, esse movimento pode esbarrar na estrutural falta de alternativas de investimento, num mercado marcado pela falta de oferta.

A falta de oferta pode sentir-se, ela mesma, em resultado do possível aumento da pressão de procura internacional, dirigida ao mercado nacional, em resultado dos novos equilíbrios geopolíticos que o conflito na Ucrânia coloca. Os movimentos de “desglobalização” e re-industrialização que foram originados com a pandemia podem agora ser acelerados pelo acentuar da lógica de blocos económicos, despertando cada vez a atenção de investidores e empresas para a posição geográfica de Portugal no Eixo Atlântico, que se volta a assumir como uma nova centralidade entre as democracias ocidentais.

Os setores de escritórios, assim como o de indústria e logística podem afirmar-se como ativos estratégicos, precisamente pela pressão que se possa sentir, num quadro no qual, segundo os dados Ci, o pipeline de novos projetos se tem reduzido, em especial em Lisboa e no Porto.

Os dados do LPI – Lisbon Prime Index mostram que, no 1º trimestre de 2022, a ocupação de escritórios em Lisboa ficou acima do padrão pré-covid. No caso do Porto, o (mais recente) PPI – Porto Prime Index mostra que esse foi um trimestre tímido. Contudo, mais do que outra coisa, esse resultado espelha a quase total ausência de áreas disponíveis, em especial de maior dimensão.

Finalmente, o novíssimo IPI – Industrial Prime Index, mostra que em 2021 o take-up neste mercado superou os 580 mil m2, em forte contraste com a quebra no novo pipeline, que conta apenas com 14 novos projetos em licenciamento.

Assim, que esperar? A resposta é incerta, sendo evidente que o mercado de imobiliário comercial vive na encruzilhada entre a crise e a oportunidade.

 

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