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EDITORIAL

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Ricardo Mateus
Ricardo Mateus
Professor na Universidade do Minho

A COP26 E O ECOTURISMO NA REGIÃO NORTE DO PAÍS

Para alguns, a Conferência COP26 foi um sucesso uma vez que, de uma forma sem precedentes, a Humanidade discutiu as consequências do atual modelo de desenvolvimento. Para a maioria, que depositava enormes expectativas no documento final, foi um fracasso. Em suma, o evento focou-se nas consequências do modelo desenvolvimento, isto é, nas alterações climáticas, e não nos verdadeiros problemas, nomeadamente nas ambições das populações dos países em vias de desenvolvimento por melhores condições de vida, no modo como os países desenvolvidos poderão contribuir para que esse desenvolvimento se processe com reduzidos impactes ambientais e nas políticas de controlo do crescimento populacional em algumas zonas do globo.

É muito difícil convencer países onde escasseiam os serviços básicos de saúde e em que parte significativa da população tem como prioridade diária o alimento que possibilita a sua sobrevivência, a tornar o ambiente uma prioridade. Tal só será possível a médio prazo, com forte investimento e transferência de conhecimento e tecnologia, que possibilite aos países em vias de desenvolvimento iniciar a sua transição energética. No entanto, não parece que os países mais desenvolvidos estejam disponíveis para esse investimento. Um dos sectores económicos nacionais mais importantes e estratégicos é o do turismo, que apresenta adicionalmente significativos impactes ambientais e sociais. A sua importância ficou bem evidente nos últimos dois anos, onde escassearam os turistas, em virtude da crise pandémica. As projeções mais otimistas apontam para que só em 2024 se recuperem os níveis de procura de 2019. Em termos ambientais, as atividades ligadas ao turismo representam cerca de 8% das emissões globais de gases de efeito estufa, sendo que aproximadamente 50% desse valor resulta do transporte dos turistas.

Portugal é considerado um bom exemplo na implementação de soluções que permitem a descarbonização da sua economia, situação que tem contribuído para a melhoria da imagem do país. Esta projeção pode ser importante para captar um novo tipo de turista, que alia uma nova definição de luxo às preocupações de sustentabilidade.

Tendo em consideração o tecido sociocultural e a tipologia das unidades de alojamento existentes, onde uma grande parte das camas (22,5%) estão em unidades de alojamento local, o norte do país poderá tirar mais partido desta nova definição de luxo, que procura experiências únicas, assentes no contacto com valores culturais, sociais, naturais e gastronómicos identitários.

São várias as medidas a promover nesta região para uma maior sustentabilidade do turismo. Destaca-se, a promoção da redução da Pegada Ecológica associada à deslocação dos turistas. Neste contexto, será de promover soluções de mobilidade de baixo impacte, assentes no transporte ferroviário de alta velocidade, investindo no eixo Porto-Vigo e recuperando a ligação a Salamanca. No licenciamento de novas unidades de alojamento, deverá ser preservada a identidade dos bairros, incentivando a criação de habitações também para o mercado de arrendamento convencional e limitando a criação de tipologias, como os T0, que são pouco flexíveis e, por isso, pouco resilientes em contextos como o resultante da crise pandémica atual. Nas linhas de financiamento, será necessário privilegiar as unidades que resultem da reabilitação de edifícios existentes, aquelas que apresentem menor número de camas e apoiar soluções que permitam a descarbonização. Para a descarbonização do sector, seria relevante promover o seu funcionamento em rede, criando Comunidades de Alojamentos de Energia Renovável que compensassem, através da produção de energia renovável, as emissões de carbono associadas aos seus hóspedes e partilhassem determinados serviços como, por exemplo, compras, limpeza, lavandaria e restauração.

O mercado global de ecoturismo foi avaliado recentemente em cerca de 180 mil milhões de euros e espera-se que o seu valor duplique até ao final da presente década, o que constitui uma oportunidade ímpar para se alterar o paradigma do sector, aproveitando as possibilidades de investimento decorrentes do Plano Nacional de Recuperação e Resiliência (PRR).

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