No 3º trimestre de 2021, no Centro Histórico do Porto a taxa de ocupação no alojamento local situou-se em 38%, superando os 24% do ano anterior, mas ficando claramente abaixo dos 70% de 2019. A quebra na procura traduziu-se na redução da oferta para pouco mais de metade, permitindo aos que ficaram não mexer nas tabelas de preços que se mantiveram globalmente estáveis. Mesmo assim, no verão de 2021 o RevPar ficou a par do último inverno pré-covid (1º trimestre de 2020). Em síntese, o “novo” verão equiparou-se ao “velho” inverno.
Apesar disso, em paralelo, qual foi o comportamento do mercado de compra e venda?
No 3º trimestre de 2021, no Centro Histórico do Porto, o percentil 5 dos preços de venda/m² situou-se nos 3.218 euros, um valor que ficou pouco aquém da média de 3.407 euros/m² que o marcado fazia em pré-pandemia. Ao mesmo tempo, a média situou-se agora nos 5.391 euros/ m², superando os 4.756 euros/m² que à data eram uma referência de máximo (dado pelo percentil 95, que ascendeu agora a 7.931 euros/m²). Ou seja, num movimento de translação, o que antes o mercado fazia com média, hoje faz como mínimo; o que antes fazia com máximo, hoje faz como média.
O que explica esta disparidade de comportamentos?
Na verdade, o Centro Histórico do Porto não teve neste período uma valorização galopante. O respetivo índice de preços apurado pela Confidencial Imobiliário mostra que, pelo contrário, teve uma pequena desvalorização, estando agora 3,1% abaixo do final de 2019. Ora, se o índice compara os preços para o mesmo perfil de imóveis em momentos de tempo distintos, sendo imune ao efeito da alteração da estrutura da procura, o que se pode concluir é que o aumento dos preços médios e máximos se deve antes de mais a uma orientação da procura para os imóveis mais caros, em detrimento dos demais. Ou seja, o mercado tem absorvido a oferta mais qualificada, sendo este o motivo para a translação de preços. A oferta mais qualificada será aquela que oferece maior potencial de resiliência relativamente à procura turística, estando mais bem reabilitada, localizada e ajustada às novas preferências “pós-covid”.
Num quadro de aumento dos custos no transporte aéreo, é expectável que o perfil dos viajantes se altere significativamente, regredindo-se quanto ao padrão de democratização atingido antes da pandemia, no qual os preços dos voos comparavam com o dos táxis na ida para o aeroporto. Ora, a mudança do perfil da procura tem implicações no perfil da oferta, provocando uma mudança estrutural desta. No essencial, está em causa uma necessidade de reposicionamento do mercado, indo de encontro à procura que terá mais capacidade para viajar, a qual terá mais poder de compra e maior nível de exigência.
Genericamente este será o desafio para os próximos anos. Reposicionar em segmentos de maior valor e menor massificação. A pressão nesse sentido deve ser acompanhada de medidas que permitam a reorientação da restante oferta para outros usos, designadamente habitacionais.
Numa primeira fase, com a chegada da pandemia, houve logo a expectativa de que parte da oferta se reorientaria para o arrendamento que, finalmente, teria a sua oportunidade. Julgo que está por provar que esse movimento existiu de forma massiva e, acima de tudo, definitiva, havendo do lado dos proprietários a expectativa de que a resolução da pandemia abrisse de novo a porta ao uso turístico.
No entanto, cada vez mais, os motivos para essa reorientação assumem um carácter definitivo, cada vez mais fruto da pressão climática do que estritamente pandémica.
É nesse quadro que importa o sucesso do programa municipal de rendas acessíveis “Porto com Sentido”. A análise feita pela Ci mostra que tem condições para se afirmar, quebrando a série de iniciativas públicas que, nas palavras do Tribunal de Contas, têm sido fortemente marcadas pela ausência de resultados.