Umas das maiores interrogações que se colocam no pós-COVID-19 e que terá certamente um forte impacto no sector imobiliário consiste na profunda e acelerada transformação digital do nosso quotidiano nas suas diferentes dimensões – trabalho, saúde, ensino, etc. e quais as consequências no médio/longo prazo da mesma, em particular nas opções relativas a onde vivemos versus onde trabalhamos/estudamos/…
Efetivamente e apesar da dimensão do desafio, subitamente vivemos um período complicado, mas em que foi possível, tirando partido das tecnologias de informação e comunicação, continuar, embora naturalmente com limitações, a “funcionar” e o teletrabalho, o ensino à distância, as teleconsultas ou o comércio eletrónico passaram a fazer parte do nosso dia-a-dia.
Sendo neste momento praticamente unânime que não voltaremos a viver como vivíamos antes da pandemia e que tal terá um impacto inevitável e que já se começou a sentir na utilização dos espaços comerciais nas áreas urbanas, bem como nas opções que as famílias tomam quanto ao local onde irão residir, e de onde podem trabalhar, estudar e ter acesso aos bens e serviços que necessitam, visto que efetivamente podem morar fora dos grandes centros urbanos aonde se deslocam apenas quando e se for necessário.
Neste ponto vale a pensar se as tendências reveladas pelos resultados preliminares do Censos 20211 serão consistentes a médio/longo prazo ou se podemos ambicionar um outro país menos litoralizado e capaz de vencer o desafio da coesão territorial.
Se tudo isto é verdade, podemos ainda antecipar uma forte aceleração deste processo com o advento do 5G e a sua generalização no território nacional, conforme tem vindo a ser proposto ser incluído no PRR.
Sendo verdade que esta tecnologia permite maior capacidade e velocidade de tráfego de dados, bem como menor latência, o que tem vindo a inspirar cenários futuros da sua utilização em áreas tão distintas e desafiantes como a medicina, veículos autónomos ou holografia, vale a pena refletir sobre o seu potencial de aceleração das alterações na forma como decidimos onde residimos e como satisfazemos as necessidades do nosso quotidiano (trabalho, saúde, ensino, cultura, etc.).
Sendo uma realidade em construção e existindo uma inevitável tendência para sobrestimarmos o impacto da tecnologia no curto prazo e subestimar o mesmo no longo prazo, é inquestionável que as mudanças serão profundas e duradouras.
Apenas como “food for tough” e cruzando o 5G com a principal crítica aos modelos atuais associados aos diferentes “tele” qualquer coisa (trabalho, ensino, saúde, …), que consiste na redução da indispensável interação social que nos caracteriza como sociedade, podemos imaginar um futuro próximo em que as horas passadas em frente a um computador em sessões contínuas de videoconferência deixarão de existir e passaremos a conseguir mimetizar com recurso a holografia e de forma bastante realista o local físico onde antes estávamos juntos?
Basta olhar para o mundo dos jogos on-line e a utilização de realidade virtual para construir experiências imersivas para percebermos que, provavelmente, o futuro é hoje e esta visão é já, em certa medida, uma realidade que rapidamente irá ser generalizada a outros setores com muito mais elevados graus de sofisticação graças à generalização do 5G e à criatividade das nossas start-ups e empreendedores que todos os dias nos surpreendem com novos produtos e serviços.
Para terminar e voltando ao mercado imobiliário, esta transformação, ou melhor, revolução em curso, terá inevitavelmente um impacto muito significativo nas opções de investimento e uso comercial e residencial. Se acrescentarmos a esta energia transformadora o papel crucial do sector no cumprimento das metas de neutralidade carbónica, estamos perante uma enorme oportunidade de serem atores ativos da construção de cidades e territórios mais inteligentes e sustentáveis, capazes de assegurar qualidade de vida às pessoas e simultaneamente responder à emergência climática.