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EDITORIAL

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Ricardo Guimarães
Ricardo Guimarães
Diretor da Ci

O QUE É LISBOA PARA QUEM A VÊ DE FORA?

Os primeiros números publicados pela Confidencial Imobiliário quando a crise pandémica se iniciou vieram contrariar as expectativas gerais que se formaram.

Quanto todos esperávamos uma descida de preços forte e generalizada, o mercado foi mantendo sempre uma trajetória positiva de valorização, apesar de numa linha de suavização face ao ritmo pré-covid. Logo no dia 9 de abril, a Ci foi a primeira a dar nota da variação de +0,4% dos preços em março, voltando um mês depois a dar nota de nova subida mensal, numa tendência que se manteve ao longo de quase todo o ano.

É o nosso papel. Mesmo que surpresos com os resultados, publicar os indicadores que apuramos, tendo por base as nossas próprias fontes de informação e metodologias, assentes no SIR – Sistema de Informação Residencial. Seguiram-se depois outras fontes, designadamente o INE, vindo reconfirmar os dados publicados pela Ci, reforçando a leitura que era feita quanto às tendências observadas no terreno. Contra todas as projeções, o “terreno” mostrou uma resiliência total, seja nos preços seja na liquidez do ritmo de vendas, recuperando no segundo semestre a perda sentida no 2º trimestre.

É verdade, todos o sabemos, que o mercado é feito de realidades muito diversas, segmentos orientados para públicos distintos e racionais de valor específicos. É verdade que, conforme os índices de preços da Ci, apesar da valorização geral do mercado, os centros históricos de Lisboa e do Porto tiveram desvalorizações significativas, traduzindo a sua ligação umbilical à atividade turística.

Mas todos temos de nos submeter a um banho de humildade e, mesmo que não consigamos explicar, no mínimo aceitar que nos podemos enganar quando opinamos sobre as dinâmicas do mercado. Especialistas, público e imprensa (que dá sobretudo eco das más notícias…).

Tudo isso para dizer o inesperado relativamente ao mercado de Lisboa.

Primeiro, quanto à oferta: em 2020, apesar de todos os ventos a desfavor, os preços de venda dos fogos novos mantiveram-se inalterados. Os promotores imobiliários já o tinham afirmado no survey que a Ci faz em parceria com a APPII, mas os números vêm-no confirmar. Ao invés de descer, pelo contrário, por exemplo na Avenida de Liberdade atingiram-se novos máximos, com preços médios de 9,5 mil euros/m². As estimativas da Ci são de quebras muito acentuadas no volume de vendas de fogos novos. Em Santo António em mais de 50%. Mas a nova geração de promotores imobiliários, fundados em capitais próprios internacionais, tem uma capacidade para enfrentar ciclos adversos que a faz diferir muito da geração anterior, a qual era profundamente dependente da dívida bancária, tendo sucumbido na crise de 2008, de mãos dadas com a Banca. Assentes em capitais próprios e sem a pressão do custo de oportunidade, mercê o contexto de baixas taxas de juro, nada mais há a fazer, se não aguardar, olhando além do curto prazo.

Segundo, quanto à procura: em 2020, apesar de todos os ventos a desfavor, a procura internacional representou 40% montante investido em habitação na ARU de Lisboa. Em número de operações representou 30%. O número de vendas desceu 10%, mas o aumento do ticket médio fez com que em valor a perda fosse de somente 3%. Considerando a queda mais do que proporcional da procura doméstica, os internacionais ganharam quota em pleno ano pandémico! Imagine-se como seria 2020 sem restrições à mobilidade…

Qual o fator comum entre os dois pontos acima? Mais do que a natureza internacional dos capitais, a visão externa sobre o que é Portugal. Sobre qual o seu valor.

Muitas vozes dirão que 40% é muito. Eu diria que se 40% for muito, aumente-se o denominador. O que significa aumentar o denominador? Simples, olhar Lisboa como cidade metropolitana, onde todos têm espaço e a valorização no centro viabiliza o investimento na geração de novas centralidades, removendo a pressão sobre o centro da cidade, mas sempre numa linha de continuidade e coerência urbanas.

Pode ser um bom tema para as eleições: o que é Lisboa para quem a vê de fora?

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